sábado, 12 de dezembro de 2009

Ela é Marluce

Cantar uma música inteira sem desafinar sempre foi o sonho dela. Sempre. Desde que aprendeu a falar e identificar as melodias de uma simples cantiga de ninar. É claro que isso é uma simples especulação de sua memória, não tem registros filmados, a não ser pelas fotos (que são mudas) das suas festas de aniversário, nem um verso de uma musiquinha em gravadores antigos. A frequente presença de canções em sua vida a fez se dedicar quatro anos às aulas de piano, mas também não acompanhava cantando, apenas transferia para as teclas a vontade que tinha de abrir a boca....era tão lindo suas mãos deslizando sobre os retângulos quadrados e pretos... sim! ela tocava com a direita e a esquerda!
Mais tarde o piano ficou pra trás. Comprou um walkman e ouvia as músicas gravadas do rádio, as que mais gostava e ainda as tradicionais de mpb. Sua vida sempre teve uma trilha sonora, uma música que lembrava uma situação ou que a levava a um futuro quase promissor.
Os anos se passaram, ela passou pelos anos assim como tantas pessoas pela sua vida e ela na vida de outras. Cada cheiro uma música, cada melodia um aperto no peito, cada nota uma vontade de sair pulando pela rua, cada silêncio entre as palavras cantadas um grito iminente na boca.
Aí, normal, tranquilo, tudo em cima, papo firme, et cetera e tal isso se tornou rotineiro, sempre com um fone no ouvido e agora, escutando as músicas que mais apetecem o contexto geral da sua existência.
Eis que há um mês, Marluce conheceu uma cantora daquelas que tocam em bar, em vários da cidade. E aí, voltou em Marluce a vontade de colocar pra fora todas as músicas, sabidas ou não por ela. Mesmo que ela fique só batendo os lábios na profunda intenção de acertar a letra numa parte que não lembra e logo depois vai pro refrão como se tivesse cantado a música inteira. Cada palavra do dia de Marluce ela pensa 'caraca, tem uma música com essa palavra, qual é mesmo?' e se mete a tentar lembrar. Ela não sai da internet procurando letras de música, coloca trechos que inventa pra ver se vem alguma coisa no google, conhece cantores e bandas de todos os lugares pra satisfazer o desejo de saber cantarolar e reconhecer uma canção ainda nos primeiros acordes quando toca no rádio.
Ela pensa que podia ter uma música chamada 'Marluce', igual a 'Beatriz', 'Ana júlia', 'Amélia', 'Luiza', mas seu nome não rima com quase nada e ninguém teve uma Marluce especial pra que compusesem uma letra pra ela.
Ela assistiu noutro dia o documentário do Nelson Freire e chorou. Ela vai voltar a tocar piano.
Além do que, está viciada na cantora e segue ela em todos os cantos onde vai se apresentar.
Marluce não vai virar cantora.
Marluce vai apenas cantar e fazer a própria trilha da sua vida.

Um comentário:

  1. Lindas imagens!
    Com ritmo, começo e fim... Um Fim que é início! Pois que a personagem em questão, há tempos saiu do papel e anda dando passos, saltinhos pela vida...

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